Quanto minha empresa deveria lucrar?
Essa é uma pergunta recorrente de empresários, gestores e até executivos financeiros de alto escalão.
Como vimos em artigo recente, a essência dos negócios é investir dinheiro hoje para obter mais dinheiro (caixa) no futuro. O caixa é rei.
Mas por que então damos tanto valor à medição do lucro?
Porque o lucro é uma forma de você medir o desempenho econômico do negócio (estamos ganhando dinheiro? Estamos indo bem?) enquanto este está em andamento. Quanto ao caixa final, só vamos ter quando a empresa encerrar suas operações, pagar e receber tudo a que tem direito, e o que sobrar é o caixa final do empreendimento que compararíamos com o investimento inicial e o custo de oportunidade.
Do ponto de vista prático, o lucro, bem medido, pode ser considerado uma excelente variável “Proxy” (variável estatística que é utilizada no lugar de uma outra de difícil mensuração) do fluxo de caixa de longo prazo da empresa. O lucro é considerado um medidor eficaz do desempenho da empresa no curto prazo, enquanto que o fluxo de caixa faria esse papel de forma mais efetiva para a medição no longo prazo.
Para que tenhamos o lucro bem medido, precisamos partir de uma definição de lucro sob um ponto de vista econômico, em que o lucro é o valor residual depois de remunerados todos os recursos consumidos e investidos num empreendimento. Como remuneração, entendemos aqui inclusive a reposição dos ativos consumidos no processo de obtenção de lucro, de modo que o ativo da companhia tenha a mesma capacidade de geração de benefícios do início do período.
Importante ressaltar que o “custo de oportunidade” do investimento não pode ser negligenciado, isto é, ao investir caixa hoje, abstendo-se do consumo presente, o investidor precisa ser remunerado pelo valor do retorno da alternativa de investimento disponível que ele teria para aplicar. A lógica aqui é simples: Você investiria numa empresa ou num projeto, se você pudesse investir numa alternativa que oferecesse um retorno semelhante e com menor risco?
A dinâmica do investimento
Ao iniciar uma empresa, os acionistas investem seu capital (Patrimônio Líquido) e esses recursos são investidos em terrenos, máquinas, equipamentos (Ativos Permanentes) e em Ativo Circulante (Contas a Receber, Estoques e um pouco de Caixa). Parte dos investimentos no ativo vai ser financiada por terceiros (Passivo Circulante e a Longo Prazo) e estes, quando na forma de empréstimos, exigem uma remuneração pelo capital emprestado (Juros). De outro lado, como já diria Benjamim Franklin, “nada é mais certo neste mundo do que a morte e os impostos”, e o lucro gera impostos que são recolhidos aos cofres do governo.
A quem o lucro remunera?
O lucro deve remunerar todos os fatores, iniciando-se pelo capital dos acionistas. O capital dos acionistas, é remunerado via dividendos (Parcela do Lucro Distribuído) e a valorização da empresa e de suas ações. Chegamos ao lucro líquido, após o pagamento dos impostos (Imposto de Renda e Contribuição Social), o pagamento dos juros pelos recursos emprestados de terceiros, a remuneração de empregados, aluguéis, serviços e, por fim, a matéria-prima e os recursos variáveis envolvidos na obtenção dos produtos e serviços oferecidos aos clientes. A Demonstração de Resultado abaixo ilustra os vários tipos de lucro e a remuneração de cada parte.
Vendas
(-) Custo da Mercadoria Vendida
(=) Lucro Bruto
(-) Despesas Operacionais
(=) Lucro Operacional ou Lucro antes dos Juros e Imposto de Renda (EBIT)
(-) Juros
(=) Lucro Antes dos Impostos (EBT)
(-) Imposto de Renda/CS
(=) Lucro Líquido (EAT)
E como se chega ao valor do lucro objetivado?
A mecânica envolve o planejamento da DRE (Demonstração de Resultado) começando pelo fim, isto é, pelo valor objetivado de lucro líquido.
Ora, o lucro líquido, como vimos, deve remunerar o acionista pelo investimento que ele tem na empresa (Patrimônio Líquido) e esta remuneração tem como base o custo de oportunidade do acionista (digamos 10% ao ano) e um prêmio de risco por investir na empresa, num segmento econômico e, em última instância, num país onde a empresa e seus clientes estão localizados. Para exemplificar, vamos imaginar que o retorno exigido pelo acionista seja de 15% e que o investimento inicial seja de R$1.000.000,00.
Assim temos que gerar de lucro líquido depois do Imposto de Renda e da Contribuição Social (que para empresas maiores gira em torno de 34% de alíquota no Brasil) de R$150.000,00, ou seja ($1.000.000,00 x 15%).
Para se chegar a esses R$150.000,00 líquidos de IR/CS, precisamos de um lucro antes do IR/CS de R$227.272,72, ou seja, (R$150.000,00/(1-34%)).
Supondo-se que para as operações normais da empresa, ela tenha se endividado em R$300.000,00 e que os juros cobrados pelo emprestador se situem em 12% a.a., precisamos somar ao lucro antes do Imposto de Renda/CS outros R$36.000,00 e chegar ao Lucro Operacional de R$263.272,72.
Como todos nós sabemos, as despesas operacionais se caracterizam por terem um comportamento fixo e assim, ao somarmos as despesas fixas de, digamos, R$200.000,00 ao lucro operacional, chegaríamos ao lucro bruto de R$463.272,72.
Se o custo das mercadorias vendidas representarem cerca de 60% das vendas líquidas, teremos então o valor necessário de vendas de R$1.158,181,80, ou seja (R$463.272,72(/)40%) para que alcancemos o lucro necessário para remunerar o acionista de acordo com as expectativas dos mesmos.
Refazendo nossa DRE (Demonstração de Resultado) teríamos:
Vendas R$1.158,181,80
(-) Custo da Mercadoria Vendida -R$ 694.909,08
(=) Lucro Bruto 40% R$ 463.272,72
(-) Despesas Operacionais -R$ 200.000,00
(=) Lucro Operacional ou Lucro antes dos Juros e Imposto de Renda (EBIT) R$ 263.272,72
(-) Juros -R$ 36.000,00
(=) Lucro Antes dos Impostos ( EBT) R$227.272,72
(-) Imposto de Renda/CS (34%) -R$ 77.272,72
(=) Lucro Líquido (EAT) R$150.000,00*
*Equivalente a 15% do valor investido pelo acionista
Resta agora saber se nossa empresa tem capacidade produtiva e competência para vender o equivalente a R$1.158,181,80, e eficiência para controlar custos e despesas dentro dos parâmetros planejados da DRE. Mas isso é tema para um outro artigo…
Clayton Nogueira. Diretor financeiro para a América Latina da Valspar Corporation. Mestre em Controladoria pela USP. MBA em Marketing pela ESPM-SP. Graduado em Administração de Empresas. Professor de Planejamento e Controle na FIAP e na FIA-USP. Conselheiro fiscal e de administração certificado pelo IBGC. Conselheiro fiscal da Abrafati. Diretor vogal no IBEF-SP.
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