Contratação de Plataforma de E-Commerce
Um consumidor comum, ao procurar um site para realizar suas compras, nem imagina que existe a complexidade do fluxo de informações por trás de cada oferta, que envolve controle de estoque,fornecedores, gestão de TI, controle financeiro, logística de entrega e recolhimento, suporte técnico, entre outros itens.
Já o fornecedor está completamente ciente de que não há como atuar na internet sem que o fluxo de informações ocorra de modo eficaz, ágil e sem interrupções, integrando as diversas áreas do seu negócio.
Para realizar essa integração, que ocorre por meio de softwares específicos também denominados simplesmente de plataforma, está o know-how de diversas empresas que os oferecem no mercado brasileiro.
Quero abrir minha loja virtual – pensa o fornecedor – e nesse intuito procura uma plataforma adequada. Só por essa intenção, já podemos aplicar o que estabelece o Código Civil, em seu artigo 112, pois “nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”.
Do seu lado, o fornecedor da plataforma conhece bem a intenção do lojista interessado em seu produto e, no afã de vendê-lo, não o alerta de que será necessário lidar com uma série de fatores, como de que forma foram inseridas as informações já existentes em seu sistema, a linguagem em que se encontra seu banco de dados, que a interação com os demais sistemas da empresa nem sempre é possível, entre outros.
Não é raro nos depararmos com casos em que o site demora muito a ficar pronto e, quando fica, apresenta diversos problemas que impedem a operação adequada do fornecedor. Quando isso ocorre é que a verdade vem à tona, qual seja, o contrato não estava bem amarrado e itens importantes ao contratante não foram previstos, o que não deixa de causar sérios prejuízos ao lojista que investiu dinheiro sem retorno satisfatório.
Para que o contratante de uma plataforma tenha mais segurança jurídica são necessários alguns cuidados:
a) inserir, nos custos do investimento, a contratação de uma boa retaguarda de TI, que será responsável por acompanhar a implantação, fornecendo ao contratante informações mais precisas e nas quais poderá confiar;
b) inserir nos custos a assessoria jurídica na hora de fechar a contratação da plataforma, pois um bom advogado poderá auxiliar o comerciante a melhor delimitar o alcance das cláusulas contratuais, quais são seus riscos jurídicos, como poderá se ver ressarcido de eventuais prejuízos, qual será o tratamento dos direitos autorais etc. Em suma, o advogado poderá pensar e levantar aquelas questões que o vendedor certamente não passaria ao cliente sem que fosse provocado;
c) atentar para a questão dos Direitos Autorais, especialmente se a plataforma for produzida internamente. Trata-se da licença de uso ou da propriedade sobre aquilo que se está desenvolvendo? As partes necessitam regular esta questão nessas situações!
d) finalmente, é possível exigir da empresa fornecedora da plataforma que formalize um acordo de nível de serviço (SLA), no qual a prestadora garanta o patamar mínimo de qualidade de seus serviços, estipulando-se multas ou descontos no caso do patamar não ser alcançado. Isso estimulará a contratada a se dedicar mais na implantação e manutenção da plataforma.
Não se pode esquecer que a contratação de uma plataforma não é uma relação de consumo, como bem ensinou o professor Rizzatto Nunes, segundo quem “o CDC não regula situações nas quais, apesar de se poder identificar um ‘destinatário final’, o produto ou serviço é entregue com a finalidade específica de servir de ‘bem de produção’ para outro produto ou serviço e via de regra não está colocado no mercado de consumo como bem de consumo, mas como de produção; o consumidor comum não o adquire”[1]. Assim, por não ser uma relação de consumo, o contratante não terá a proteção que a lei oferece aos vulneráveis e hipossuficientes em geral, como ocorre com os consumidores. Deve, portanto, se precaver da melhor forma possível para, depois de tanto investimento, não ficar a ver navios.
Márcio Cots é professor de Direito e Tecnologia nos MBAs da FIAP. Mestre em Direito pela FADISP. Extensão Universitária em Direito da Tecnologia da Informação pela FGV-EPGE e especialista em Cyberlaw (Direito Cibernético) pela Harvard Law School – Harvard University – EUA. Foi Direito Jurídico e de Compliance de empresas de tecnologia por mais de 10 anos. Autor de diversos artigos sobre o tema Direito Digital e E-Commerce. Participou como jurista contratado da Ordem dos Advogados de Angola, nos projetos de lei para regulamentação do uso da Internet e é membro da Comissão de Crimes Eletrônicos e de Alta Tecnologia da OAB/SP, assim como associado à ABComm – Associação Brasileira de Comércio Eletrônico. Sócio do escritório Cots Advogados, especializado em Direito Digital e E-Commerce.
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